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  • Foto do escritorProf. Gildo Gomes

A FESTA NATALINA NA BÍBLIA E NA HISTÓRIA



Dezembro é o último mês do ano e cheio de cores, luzes, enfeites, presentes, confraternização, jantares e momentos felizes. Na prática atual não existe uma comemoração do natal, o que acontece é um momento familiar fraterno e só. Porém os poucos cristãos que o comemoram dizem que houve uma celebração e alegria no nascimento de Cristo, e, portanto, é biblicamente justificável festeja-lo nesse período. Sim, cremos que houve uma imensa e única celebração quando o verbo se fez carne (Jo 1.14). A questão é que a celebração ocorrida pelo nascimento de Cristo é inigualável e impossível de repetir-se: aparição de anjos, sonhos, visões, mensagem angélica, exército de anjos nos céus, astro que anuncia o nascimento, visita de pastores e presentes de sábios. Ainda adolescente me tornei evangélico e cresci numa igreja pentecostal contrária a celebração natalina, com explicações superficiais da não comemoração. O que às vezes se dizia era que se tratava de uma festa pagã1. As verdadeiras razões bíblicas e históricas não eram devidamente apresentadas. Já outros favoráveis ao natal diziam ser uma época boa para se pregar o evangelho, pois os corações das pessoas estariam mais receptíveis ao amor de Deus. Segundo a Bíblia os cristãos devem pregar Cristo todos os dias “a tempo e fora de tempo” (2Tm 4.2). O anúncio do evangelho que inclui nascimento, morte e ressurreição de Cristo, tanto no período natalino ou em qualquer época do ano, visa a proclamação da verdade de Deus num mundo caído, na esperança que Deus conceda arrependimento ao pecador (2Tm 2.25), sabendo que o coração do ser humano é duro como uma rocha. Só a palavra de Deus o amolece (Ez 36.26). Como dizia Lutero: “Três foram os milagres que ocorreram na natividade: Deus se tornou homem, uma virgem concebeu e Maria creu”2. Desses três milagres Deus em seu poder e graça continua a operar o último no mundo.


AS “FAKE NEWS” SOBRE A ORIGEM DA CELEBRAÇÃO NATALINA



Ao longo da história muitos cristão sinceros, acreditaram e ensinaram “feke news” sobre as origens da celebração natalina. O objetivo era dissuadir as pessoas da comemoração do Natal. Acredito que semelhante a mim, outros cristãos só com o tempo aprenderam as verdadeiras razões da não celebração dessa festa desautorizada pela escritura. Entre as razões “fake news” por parte de certos cristãos, mencionam-se as seguintes: 1) Natal em inglês é Christmas, uma mistura do nome de Cristo com missa e, portanto, resquício do catolicismo3. Porém isso não quer dizer que se um evangélico celebra o natal ele se torna um católico romano. Lutero, mesmo após deixar de ser monge, celebrava o natal e nem por isso estava voltando a Igreja Católica. 2) A data de 25 de dezembro era o aniversário de Ninrode, que dizem casou-se com sua mãe Semírames. Após sua morte, virou o “deus sol” que visitava uma árvore para deixar presentes na data do seu nascimento4. Essa lenda foi difundida pelo livro “As Duas Babilônias” do presbiteriano escocês, Alexander Hislop, no século XIX. No Brasil o mito da Semíramis cresceu mais ainda com a novela Gênesis da Record de 2021; 3) A Bíblia é contra a celebração natalina porque condena a comemoração de aniversários. As Testemunhas de Jeová creem assim. Elas afirmam que a escritura proíbe a celebração de aniversários porque na Bíblia só há comemoração da data natalícia de reis ímpios como Faraó e Herodes5. Creem também que a estrela foi colocada por Satanás como sinal aos sábios do oriente que vieram até Jerusalém. Nada há na escritura que reprove o crente de reunir-se com amigos e familiares para comemorar seu aniversário assim como os filhos do patriarca Jó realizavam banquetes festivos (Jó 1.4); 4) No meio neopentecostal acredita-se que árvores de natal, guirlandas, bolinhas brilhantes, anjinhos pendurados são coisas do diabo e trazem maldições para a família. O não uso desses símbolos natalinos não é por causa de qualquer maldição nos objetos, e, sim, pela rejeição daquilo que representam - uma festa não autorizada na escritura; 5) O 25 de dezembro era a data de aniversário do Imperador Constantino7 o que seria uma blasfêmia transferi-lo para o natal de Cristo. Historicamente Constantino não aniversariava em 25 de dezembro8. Ele nasceu em 27 de fevereiro de 270 ou 272 d.C.; e 6) Por último, dizer que a festa do natal tem uma origem pagã não é propriamente uma fake news, porém mal aplicada por muitos cristãos.  Dos argumentos anteriores, esse é único que tem evidência histórica, mas sozinho seria insuficiente para se rejeitar a celebração natalina. Historiadores de renome mundial como Justo L González9, Richard J. Bauckham10 e Earle E. Cairns11 confirmam a origem pagã da festa natalina.  


OS CRISTÃOS PRIMITIVOS E A CELEBRAÇÃO DO NATAL



Nos primeiros séculos da igreja cristã não se celebrava o natal. O curioso é que no Adventismo do Sétimo Dia, por exemplo, a profetisa Ellen White incentiva a comemoração do natal, e diz que o domingo como Dia do Senhor entrou na igreja após decreto do imperador Constantino12. Há registros dos cristãos se reunindo no domingo para cultuar ao Senhor bem antes de Constantino nascer ou se tornar imperador como na Didaquê (50 a 70 d.C.); Inácio (100 d.C.); Barnabé (120 d.C.); Justino, o Mártir (100-167 d.C.) e Tertuliano (160-220). Uma pesquisa semelhante mostrará completa ausência da celebração natalina entre os cristãos antes do IV século. O primeiro documento que menciona o natal em dezembro é “O Cronógrafo de 354” que são vários escritos com diversas informações, principalmente com a história e cronologia de Roma13. Essa ausência da celebração do nascimento de Cristo pelos crentes mais próximos das origens cristãs, chama-nos bastante atenção. Em resumo as razões bíblico-teológicas e históricas a seguir são satisfatórias e convincentes da não celebração natalina: 1) Os evangelhos não registram nem data e nem aniversário de Jesus. Apesar dos autores falarem da manjedoura, é a cruz o tema central dos relatos neotestamentários. O que sabemos do 25 de dezembro é que Jesus nesse dia estava na Festa da Dedicação (Jo 10.22-24; ver o apócrifo 1Mac 4.52-54); 2) O nascimento de Cristo é antes de tudo uma encarnação e dessa forma a comemoração natalícia não tem semelhança na história mundial (Jo 1.1,14). Não há como acender velinhas para Cristo e cantar os parabéns. O eterno não tem aniversário. 3) Os Atos dos Apóstolos como testemunho histórico fidedigno do começo da igreja, ensino e formação das primeiras comunidades cristãs não menciona celebração natalina, seja pelos apóstolos ou cristãos judeus e gentios; 4) Nas epístolas temos doutrina e orientação sobre batismo e ceia como os sacramentos celebrados pela igreja, mas nunca a orientação de celebrar o nascimento de Cristo; 5) Nos três primeiros séculos da igreja os cristãos não comemoravam o nascimento de Cristo. Tanto Irineu (120-220 d.C.) quanto Tertuliano (150-212) não citam o natal na sua lista de festas; e 6) Mesmo o natal celebrado por muitos cristãos ao longo da história não se compara ao tipo de comemoração realizada em nosso tempo. Como disse François Turrentini (1623-1687): “Se algumas igrejas reformadas ainda observam algumas festas (como a concepção, a natividade, a paixão, e a ascensão de Cristo), diferem amplamente dos papistas, porque dedicam esses dias somente a Deus e não a criatura”14.


OS PROTESTANTES E A CELEBRAÇÃO DO NATAL


O filme Saintes & Stranger trata da viagem dos peregrinos no Mayflower para o Novo Mundo. Numa cena ver-se uma celebração de natal em 1620. Um grupo de cristãos cantam enquanto os puritanos continuam seus trabalhos diários. Nesse momento se estabelecem um diálogo entre três homens que cantavam os louvores natalinos e olhavam para os puritanos:

- Por que eles não cantam?

- Eles não comemoram o Natal. Não consta nas escrituras eles dizem.

- Não?

- Eu nunca cheguei a averiguar a questão.

- Isso é bobagem. É claro que é. Não celebrar o nascimento do nosso Salvador. Que tipo de cristão eles são?

- Cabeças duras.

O tema do natal no protestantismo divide as opiniões no passado e no presente. Há alguns anos no presbiterianismo brasileiro, os reverendos Solano Portela e Paulo Anglada (1954-2009) divergiam com o primeiro a favor e o segundo contra. Os puritanos assim como os batistas antigos rejeitavam a comemoração natalina15. John Nox (1514-1558) no Livro de Disciplina da Igreja da Escócia menciona o natal entre as invenções dos papistas16. ;

A congregação de Jonathas Edwards (1703-1758) não celebrava o natal17. O batista Charles Spurgeon (1834-1892), nos Tesouros de Davi, seu comentário de Salmos escreveu: “Quando puder ser comprovada que a observância do Natal, Semana do Pentecostes e outras festas foi instituída por estatuto divino, também o observaremos, mas não até então. É tanto nosso dever rejeitar as tradições dos homens, quanto observar as ordenanças do Senhor. Perguntamos acerca de todo rito e tradição estabelecida: “é uma ordenança do Deus de Jacó?” Caso não esteja devidamente evidente, não exerce nenhuma autoridade sobre nós que andamos segundo a liberdade cristã”18.


Nós da ICB - Igreja Cristã Bíblica acreditamos que a não realização de cultos natalinos segue melhor o Principio Regulador do Culto, ao contrário do Princípio Normativo como fazem luteranos, anglicanos e católico romanos, segundo o qual o que não é proibido na escritura é permitido no ato da adoração. Não celebramos culto natalino, e os crentes tem a liberdade cristã em suas confraternizações familiares. Os puritanos ingleses no século XVII que eram contrários aos festejos natalinos nas ruas, não se opunham a quem fazia suas devoções em suas residências19. Nesse período como nos outros dias do ano, anunciamos a encarnação, morte e ressurreição de Cristo que é a mensagem do evangelho. Não fazemos do natal uma bandeira de guerra, brigas e divisões na congregação ou fora dela, pois cremos que o crescimento no evangelho sob a ação do Espirito Santo, tanto corrige os erros e crenças da cultura religiosa que nos cerca, quanto nos concede graça para compreendermos e amarmos os que pensam diferentes de nós em assuntos não essenciais para a fé cristã. 

Graça e paz para todos. Feliz 2024!

 




Referências bibliográficas

[1] Mensageiro da Paz, Artigos Históricos, Vols 2, p. 52-54 e 3 p. 116-118. Rio de Janeiro: CPAD, 2004.

[2] BAINTON, Roland H. Cativo à Palavra. São Paulo: Vida Nova, 2017. p. 372

[3] WOODROW, Ralph. Babilônia: A religião dos mistérios antiga e moderna. Associação Evangélica, 1966. p.156

[4] NETO, José Barbosa de Sena. Confissões surpreendentes de um ex-confessor. Fortaleza: Gráfica Verdes Mares Ltda. 1998. p. 15

[5] SILVA, Ezequias Soares da. Como responder às Testemunhas de Jeová. São Paulo: Candeia, p. 381

[6] Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados. O maior homem que já viveu. São Paulo: 1991. p.8

[7] NICODEMUS, Augustus. O ateísmo cristão. São Paulo: Mundo Cristão, 2011. p. 112 

[8] LEITHART, Peter. Em defesa de Constantino. Brasília: Editora Monergismo, 2020. p. 60 

[9] JUSTO, L. González. Uma história do pensamento cristão vol.1. São Paulo: Cultura Cristã, 2015. p.55 

[10] CARSON, D.A. (org.) Do Shabbath para o Dia do Senhor. São Paulo: Cultura Cristã, 2006. p. 283 

[11] CAIRNS, Earle E. O Cristianismo através dos séculos. São Paulo: Vida Nova, 1995. p. 97

[12] WHITE, Ellen G. A Grande Controvérsia. Minas Gerais: IAGE:  2019. p. 47 

[13] GONZÁLEZ. Justo L. História da literatura cristã antiga. Rio de Janeiro, CPAD:  2020. p. 343 

[14] TURRETINI, François. Compêndio de Teologia e Apologética, vol II. São Paulo: Cultura Cristã, 2011. p. 137.

[15] CHUTE, Anthony L. et al. História dos Batistas. Rio de Janeiro: Editora Pro Nobis, 2022. p. 96.

[16] FERREIRA, Franklim (editor). A Glória da graça de Deus. Rio de Janeira: Editora Fiel, 2010. p. 379.

[17] MURRAY, Iain H. Jonathan Edwards uma nova biografia. São Paulo: PES, 2015. p. 180

[18] SPURGEON, Charles. Os Tesouros de Davi vol 2. Rio de Janeiro: CPAD, 2017. p. 506,507.

[19] Ryken Leland. Santos no Mundo. São Paulo: Fiel, 2013. p. 312.

 

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